segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

 meu projeto "Água & Vinho"





e é claro que havia uma tristeza muito grande nos seus olhos


1.

todas as horas lhe eram horas de agonia

desde a manhã até a noite 

e ao meio do dia 

olhando as rosas no quintal


havia sonhos pendurados nas paredes

e atrás da porta uma lembrança

o espreitava 

segurando um punhal


e na varanda havia bocas à sua espera

havia dentes à sua espera

havia um acidente casual


pois sua morte era morrer tão de repente

que passaria a olhos vistos

como um fenômeno banal


2.

deixa essas flores florescerem neste inverno

que a juventude é uma rosa

e já não cabe nesse terno


deixa essas flores florescerem de repente

que a juventude é uma rosa

e está secando lentamente


3.

seus sonhos eram puro devaneio

e ele era feito do mesmo material dos sonhos





Lorca


ele escutou o chamado do seu coração

nas roupas de Lorca havia uma bandeira desenhada


te espero amanhã para um copo em Granada

e se Eles disserem que não

te espero assim mesmo meu irmão 

em Granada


ele atendeu o apelo das mãos

e assumiu um compromisso muito sério


no sangue de Lorca havia uma alma misturada

debaixo das roupas e dos lençóis muito brancos


nenhum outro antes dele entendeu a importância do ouvido

e a quantidade exata de sentido nas palavras


e se Eles disseram que não

te espero amanhã para um copo em Granada

mesmo que Eles insistam que não

te espero assim mesmo 

para uma gargalhada





os falos não rosam


meu coração não tem sabor

mas serve como refeição

para o demônio 

do amor


velho castelo abandonado

de vez em quando é reservado

para uma festa 

de salão


onde a condessa (vejam vocês)

penetra para festejar

zombando da minha 

embriaguez


mas sem saber que o seu olhar

faz o que não falo arrebentar

e meu coração bater 

outra vez






salina


1.

preparar o sal canto do sal ao meio-dia  

pra fazer o pão

logo o sal é trigo

não é trigo não


2.

João nasceu do sal      lenda do sal

foi sal quem lhe gerou

foi sal quem lhe pariu

foi sal sua mãe

    seu pai

seu irmão


e tudo o que aprendeu

foi sal quem lhe ensinou

foi sal quem lhe instruiu

foi sal o que aprendeu

foi sal seu professor


e os dias eram iguais

e assim João viveu

e só em meio ao sal 

um dia 

então 

João morreu


suas mãos rachadas

seus pés rachados

João ra

chou 

e vi

rou 

sal

tam

bém


3.

moinho de vento      canto do sal à meia-noite

gira como o mundo

na salina

gira tão depressa

quanto a minha cabeça

vagueia

domingo, 15 de março de 2020

Poemas do Caderno Verde (2007-2010) Final Mentes 4


a arte de escrever poesia

escrevo a palavra
risco a palavra
arisca palavra
prescreve

eu escrevo ela
ou ela me escreve

quando leio o escrito
penso tá feio
ou gosto
tá bonito

risco ou deixo
conforme o julgamento
escrevo num momento
depois leio
                 releio

e então
passa o sentimento
morre a ideia
cala-se a música



Fim de "Caderno Verde".

Poemas do Caderno Verde (2007-2010) Final Mentes 3


então

então este é o fim

não há mais terras
não há mais águas
não há mais ventos
não há mais fogos
não há mais nada

das janelas abismos
apenas olhamos
e você que pergunta
aonde foi que chegamos
sente calor passa frio

na verdade

na verdade meu amigo

você devia olhar para cima
e encarar este céu sem estrelas
abrir os seu olhos
e ouvir o assobio
que apagou os limites

quem sabe gozar
no seu último minuto
e parar de ficar repetindo
para si mesmo
que não imaginava que
tudo terminaria assim