sexta-feira, 27 de março de 2015

poemas da caixa de papelão 24

limites

dentro de um coração em chamas
havia palavras que não se afogavam
palavras sujas
palavras benditas
palavras sobre palavras

palavras que se precipitavam
mas de repente passavam
pois nem sempre é dado tempo ao
que necessita de tempo
e mesmo o fogo que é fogo
um dia se apaga

dentro de uma mente brilhante
havia versos que se chocavam
mas no fundo o mundo
os queria mudos
e os ouvidos para ouvi-los
não se criaram

é sempre assim
quando se tenta dar palavras ao amor
do amor só se consegue calar

domingo, 22 de março de 2015

poemas da caixa de papelão 23

do amor

a alma procura o outro
o amigo
a amante

percorre a cidade as ruas
sujas
incontáveis
escuras
à procura do outro

desce até o inferno
e mesmo ao céu
pode ser alçada
nesta vã tentativa
nesta louca empreitada

a alma
procura aquela que
ascenderá a vela
e iluminará o quarto
partilhando o espanto

e revelada a cura
manterá a calma
pois será o amigo
e será a amante

o corpo
é muito
por demais preguiçoso
mas é forçado a seguir
vivendo
nesta eterna loucura
nesta mesma procura

terça-feira, 17 de março de 2015

poemas da caixa de papelão 22

dupla demência

1.
na praça
um pombo que passa
dá o ar de sua graça
e pousa em meu dedo

eu falo com ele
e ele me entende
lhe conto um segredo
e ele me entende

na praça
as pessoas que passam
talvez por ter pressa
até acham graça

talvez por inveja
elas não compreendem
um homem e um pombo
falando igual gente

2.
na praça
um homem que passa
me estende o seu dedo
e eu pouso sem medo

ele fala comigo
e eu não entendo
mas balanço a cabeça
talvez por ter pena

na praça
sobre nossas cabeças
há uma nuvem que passa
gritando os segredos

de infinitos milagres
e só eu a entendo
pois ela fala comigo
a linguagem dos ventos